Alguém fez um verso que corre o mundo e que é mais ou menos assim: a rosa que é uma rosa que é uma rosa… Confessamos não saber mais quem seja o autor: T. S. Eliot, Drumond, Paulo Bonfim, Carlos Lacerda? Não importa. Hoje vamos tratar de uma praça que não é uma praça, que nunca foi uma praça, para parafrasear o verso famoso e fazer um pouco de onda…
Então, se não é uma praça, se nunca o foi, por que se chama Praça? perguntará o leitor. Bem, quando do falecimento do Monsenhor João Rulli, o Vereador Miguel Jacob Daur (por sinal que foi um dos melhores vereadores de seu tempo), amigo e admirador do prelado (e quem não o era?), desejoso de homenageá-lo apresentou à Câmara um projeto de lei dando ao local onde se achava a Santa Casa de Misericórdia de Ituverava, ainda sem os muros e o jardim da frente, o nome de “Praça Monsenhor Rulli”.
E a Câmara de então, também ansiosa por homenagear o grande benfeitor da cidade, com certa leveza, mais que depressa aprovou o projeto. Não foi sem razão que o Capitão Joaquim Alves Leite, encontrando-se dias depois com um vereador, interpelou-o: “Então a Câmara deu agora para atribui nomes a terrenos particulares?!”
Diante da surpresa encabulada do vereador, por sinal que membro da então Comissão de Justiça, explicou-lhe ao Capitão Leite que ele e o Capitão Antônio Justino Falleiros haviam doado à Santa Casa (sem nenhum patrimônio ainda, tendo apenas diretorias que se revezavam) um terreno situado entre as Ruas dos Carros, a então José Barbosa Nunes (hoje Maria Liporaci), ruas sem denominação (na época ainda) que partiam da Avenida General Francisco Glicério (hoje Avenida Dr. José Aníbal Soares de Oliveira), terreno este em que se edificou, mais tarde, o monumental edifício daquele hospital (ia dizer nosocômio como toda a gente na época, mas a palavra é horrível!).
De fato, no Cartório do Primeiro Tabelionato local, fls. 59, Livro 59 lá está a escritura em questão, conforme tivemos ocasião de verificar. Portanto particular era o terreno e a Câmara não poderia dispor dele, nem para dar-lhe denominação, como fizera. Daí o termo dito que é uma praça que não é uma praça, pois foi sempre terreno particular.
Antes pertencera ao Sr. Maximino de Paula Souza, antigo Coletor Estadual e fazendeiro, que ali criou seus filhos, em extensa chácara, à margem do beco da Caixa d’água, que tinha início junto do antigo “Posto Gino” e se prolongava até a Rua dos Carros (hoje Maria Liporaci). Ali viveram sua infância despreocupada e prazenteira o Paula Neto (Fiinho, segundo o Abady), o Octacílio e o Antônio, belo rapaz falecido em plena mocidade, todos filhos do Capitão. O Paula Neto teve uma glória — a de ter sido o melhor aluno do Colégio Montenegro, e o aluno favorito do Dr. Américo Montenegro. Isto — quando era bonito ser o melhor aluno … o sr. Otacílio foi o ilustre secretário do Instituto de Educação.
O PATRONO — Monsenhor João Rulli nasceu perto do mar, na pequena cidade de Bovalino Superior, província de Reggio, na Calábria, no dia 11 de abril de 1874.
Aprendidas as primeiras letras, partiu ele para a cidade de Gerace, da mesma província, onde permaneceu cerca de 14 anos, até ordenar-se com a idade de 23 anos. Nesse intervalo cursou pedagogia, cuja disciplina ensinou na Escola Normal Vitório Emanuel, da mesma cidade, e fez os cursos de filosofia, teologia e direito canônico no seminário.
Antes de vir para o Brasil, foi capelão do Colégio de Surdos-Mudos de Nápoles. Em 1904, com a idade de 30 anos, chegou o então Padre Rulli ao Brasil, nomeado que fora coadjutor da paróquia de Araraquara, onde permaneceu dois anos, aprendendo a língua (que veio a falar e escrever bem), e entrosando- -se nos costumes brasileiros, serviu depois em Pindamonhangaba, depois em Cascavel e Vargem Grande, já como vigário, e, em seguida, em São José do Rio Pardo (como substituto), e depois para Vila Bonfim, Brodowski e em São Joaquim da Barra.
Tanto em Brodowski como em Vargem Grande construiu suntuosas matrizes. Na primeira delas, veio a conhecer um menino muito hábil no desenho. Chamava-se Cândido, pertencia a uma família de italianos modestos, e o padre Rulli o animou a prosseguir desenhando.
Mais tarde, o mundo todo veio a Conhecer o menino de Brodowski como o grande Portinari. Finalmente, o padre Rullí viu-se nomeado vigário da Paróquia de Ituverava, em substituição ao cônego Marcos Santiago, tendo aqui chegado no dia primeiro de março de 1928. Tinha 51 anos de idade e 27 de vida sacerdotal. A igreja matriz nova, a da antiga Praça Rui Barbosa e atual Deputado Hélvio Nunes da Silva, estava iniciada, mas coube ao Padre Rulli o trabalho hercúleo de praticamente edificar toda a soberba Matriz de Ituverava. E trabalhou com tal denodo que, pouco mais de três anos depois de sua chegada, já em 1929, o templo estava terminado, faltando apenas parte da pintura, feitas mais tarde por verdadeiros artistas. As decorações da capela-mor e da nova constituem apreciáveis obras de arte.
Depois de onze anos de trabalho, visitou a mãe pátria, recebendo, por ocasião do regresso da Itália, entusiásticas homenagens de seus paroquianos e também do mundo eclesiástico da região.
O dia jubilar do padre Rulli ocorreu a 17 de dezembro de 1947, e as festividades que o assinalaram foram realizadas aqui no dia 6 de janeiro de 1948. A solene missa pontifical celebrada naquele dia, na Igreja Matriz, pelo Bispo Diocesano Dom Manuel da Silveira D’Elboux, “foi cerimônia de extraordinária beleza e extremamente tocante aos corações ituveravenses, que, comovidos, viam no altar-mor”.
O Padre João Rulli é considerado o precursor da Santa Casa de Misericórdia de Ituverava, tendo liderado suas primeiras e importantes construções. Além da obra de magnitude incalculável no passado e atualmente, o hospital foi de suma importância para o crescimento da cidade, no que se refere ao desenvolvimento da cidade rumo ao encontro com a Rodovia Anhanguera.
A Praça Monsenhor João Rulli, na frente da entrada principal da Santa Casa de Misericórdia de Ituverava é uma das mais justas homenagens e reconhecimentos por seu trabalho em prol da fundação e construção da entidade, que hoje é uma das mais importantes do Brasil, mas principalmente um dos maiores patrimônios de Ituverava. Referência em atendimento à população da região e exemplo de boa administração, sendo ainda uma das maiores empregadoras e geradoras de renda do município de Ituverava atualmente, demonstrando que além de pensar na caridade de promover saúde com dignidade à população mais carente da época, revela a vertente empreendedora e futurista do Monsenhor João Rulli, projetando o que hoje é um dos maiores orgulhos dos ituveravenses.
Uma forma de demonstrar que a cidade reconhece aqueles que por aqui passam, deixam suas obras, mas principalmente o legado para tantas gerações, que vem sucedendo tanto na paróquia como na condução da Santa Casa.
